MECANISMOS GERAIS DA DEPENDÊNCIA (Continuação)
08/05/2025

A cocaína aumenta a resistência ao álcool, porque um pouco de seu efeito depressor é atenuado pela cocaína. Por outro lado, a pessoa tolera quantidades maiores de álcool, porque precisa abrandar os efeitos altamente excitantes que a cocaína produz. Sempre é válido repetir que álcool e cocaína representam uma das associações de drogas mais perigosas que existem.
Ao que parece, tal associação dá origem a uma terceira molécula extremamente tóxica para cérebro e para o músculo cardíaco. Infelizmente, no Brasil, não há dados precisos sobre o que aconteceu com os usuários de cocaína, porque o sistema médico não é muito coordenado. Se eles existissem, ficaríamos horrorizados. Tivemos uma pequena experiência acompanhando, por cinco anos, o primeiro grupo de usuários de crack que foi internado em Cidade de Taipas, interior de São Paulo. Era uma população de classe média baixa. No final desse período, 30% tinham morrido em acidentes ou por morte violenta. Nesse caso, as famílias não sabiam dizer quem eram os responsáveis pelas mortes: os traficantes ou a polícia.
Não sabemos se isso ocorre com todos os usuários de crack. Temos certeza, porém, de que poucas doenças apresentam esse índice de mortalidade.
Os mecanismos gerais da dependência química envolvem uma complexa interação entre fatores biológicos, psicológicos e sociais. A seguir, estão os principais mecanismos envolvidos:
1. Mecanismos Neurobiológicos
A dependência química está fortemente ligada ao funcionamento do cérebro, principalmente ao sistema de recompensa.
- Sistema de recompensa (dopaminérgico): Substâncias como álcool, cocaína, nicotina, opioides e outras aumentam a liberação de dopamina em áreas como o núcleo accumbens, gerando sensação de prazer.
- Neuroadaptação: Com o uso contínuo, o cérebro se adapta, reduzindo sua resposta natural à dopamina. Isso leva à tolerância (necessidade de doses maiores para o mesmo efeito) e à abstinência (efeitos negativos quando a droga é retirada).
- Plasticidade cerebral: Mudanças duradouras na estrutura e função dos neurônios, que dificultam o controle dos impulsos e favorecem o comportamento compulsivo.
2. Fatores Psicológicos
- Transtornos mentais: Depressão, ansiedade, TDAH, transtornos de personalidade e outros são comuns em pessoas com dependência.
- Mecanismos de enfrentamento: Uso de substâncias para lidar com dor emocional, estresse ou traumas.
- Reflexo condicionado: Ambientes e situações associadas ao uso da droga podem desencadear desejo (craving), mesmo após longos períodos de abstinência.
3. Fatores Genéticos
- Estudos mostram que a hereditariedade tem um papel significativo, com fatores genéticos explicando até 40-60% da vulnerabilidade à dependência.
- Genes relacionados a receptores de dopamina, metabolização de drogas e controle do impulso estão envolvidos.
4. Fatores Sociais e Ambientais
- Disponibilidade da substância: Quanto mais fácil o acesso, maior o risco.
- Influência social: Pressão de pares, normas culturais e familiares.
- Vulnerabilidades sociais: Pobreza, violência, exclusão, falta de suporte familiar.
5. Aspectos Comportamentais
- A dependência é mantida por reforços positivos (prazer) e negativos (alívio de sintomas de abstinência).
- Comportamentos de busca e uso da droga tornam-se compulsivos, mesmo diante de consequências negativas.
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